O Fair Play esteve à conversa com a campeã europeia Tamila Holub. Depois de um ano de sonho, fomos saber quais são os planos para o futuro da nadadora do Sporting de Braga, treinada pelo Professor Luís Cameira.
: 2016 foi um ano de ouro para ti. Campeã da Europa de Juniores e participação nos Jogos Olímpicos. Qual consideras ter sido o ponto alto da tua época?
TH. Ter sido campeã da Europa!
Ter ido aos Jogos Olímpicos foi fantástico, mas ver a bandeira subir e ouvir o hino tocar…não se compara.
Escolher só um ponto alto da época passada é complicado porque tive muito momentos especiais dos quais me vou recordar para sempre, mas ter sido campeã da Europa foi muito especial.
: Foste campeã europeia dos 1500 metros, uma prova que terminaste com alguma vantagem. Durante a prova já estavas a perceber que ias ser campeã europeia? Como é que geriste esse misto de ansiedade e euforia?
TH. No momento passam muitas coisa pela cabeça. Se por um lado ir à frente me motivava e me fazia pensar que o objectivo estava cada vez mais perto, por outro sentia receio e nervosismo de poder quebrar o ritmo.
Mas ajudou-me muito ter vindo para a frente da prova e tê-la feito sempre com o pensamento de fugir das adversárias. Os últimos 300 metros custaram-me muito mas eu mantinha esse pensamento: “tenho de fugir delas”.
: No final dessa prova o teu treinador deu-te um longo abraço. A relação de confiança que estabeleceste com ele também é importante para estas conquistas?
TH. É mesmo muito importante. É das pessoas que melhor me compreende, sabe gerir a minha cabeça e sabe gerir o meu esforço. Foi um longo trabalho até àquela medalha e eu nunca direi que aquela foi um vitória minha, foi uma vitória nossa!
: E o apuramento para os Jogos, achavas que seria possível?
TH. Nesse aspecto foi um ano muito nervoso, porque foi a época toda a pensar nesses mínimos.
Quando cheguei ao Meeting de Coimbra tinha mais duas oportunidades para fazer os mínimos. Essa competição correu-me muito bem e, depois de ter visto o tempo, fiquei com muitas esperanças. Quando houve a confirmação foi…excepcional! Foi no dia da prova de 1500 [nos Europeus de Juniores] e por isso foi um dia em cheio.
: Vou fazer uma pergunta algo parecido com a que já fiz: nos 1500 foste campeã europeia, mas a prova não dá apuramento para os Jogos, já que não é prova olímpica. Nos 800 foste vice-campeã mas com apuramento para os Jogos. Qual consideras ter sido a mais importante para a tua carreira?
TH. Continuo a dizer que foram os 1500. Foi uma prova onde me transcendi porque era mesmo muito importante para mim vencê-la.
: Foste a “benjamim” portuguesa nos Jogos. Como foste recebida pela comitiva nacional?
TH. Fui recebida muito bem. Muita gente com experiência que me recebeu com muita paciência [risos]. Tentei acompanhar o desempenho dos outros portugueses o máximo que conseguia, mas nós [na natação] tínhamos horários muito diferentes.
Mas fui mesmo muito bem recebida. O espírito dos Jogos também ajuda, é alegria por todo o lado.
: Nos Jogos já não estavas na melhor fase da tua época?
TH. Foi uma época muito desgastante. Tinha apontado o pico de forma para os Europeus e, para além disso, nos Europeus consegui ficar calma e gerir bem as provas.
Quando cheguei ao Rio até estava calma e não entrei em pânico por serem os Jogos Olímpicos, mas três dias antes da prova começou a dar-me o nervosismo e quando subi ao bloco estava quase a tremer [risos].
Mas aí, sim, já senti muito o cansaço e o desgaste. Já nadava e sentia as provas que fiz durante toda a época “em cima de mim”.
: E agora, já só pensas em Tóquio?
TH. Já! Foi logo…
Antes do Rio eu via no Instagram ou no Facebook outros atletas a dizer “Faltam 150 dias para os Jogos…” e eu não percebia aquela ansiedade e aquele entusiasmo, e agora percebo.
Agora sou eu que estou a fazer a contagem decrescente. Já comecei! [risos]
Agora percebo o grau de importância de uns Jogos Olímpicos, percebo que é uma competição única e a minha segunda participação já vai ter outros objectivos.
: Esta época começou mais tarde para ti. O teu melhor está reservado para o Mundial?
TH. Sim. Este é o meu primeiro ano de sénior. Até ao ano passado tinha as provas de juniores para me distrair [risos], mas com Festivais Olímpicos da Juventude, Campeonatos Europeus de Juniores, etc…tinha de gerir muitas vezes o esforço e nem sempre estava no meu melhor nas competições de absolutos.
Agora o único objectivo são as competições de absolutos e é o meu grande foco para este ano, o Mundial de Budapeste.
: Internamente, tens protagonizado grandes duelos com a Diana Durães. É importante ter, também, essa competitividade interna?
TH. É muito importante porque nos habituamos a ir sempre ao máximo em todas as provas para podermos chegar em primeiro.
Claro que eu preferia ir sozinha, ia muito mais relaxada para a prova, mas também motiva vir para a piscina e pensar que vamos ter este tipo de duelos.
: Estás no 12º ano. Já pensas como vai ser para o ano?
TH. Estou a pensar nisso. [risos]
Eu quero seguir medicina e poderia seguir por essa via aqui em Portugal, mas ao mesmo tempo quero olhar para o meu futuro próximo de uma forma mais abrangente e não me focar só num ponto.
Quero ir experimentar coisas novas, experimentar diferentes formas de treinos, quero aproveitar antes de me focar na carreira académica.
: Vou-te propor um jogo. Peço-te que me indiques o adjectivo que melhor te caracteriza nos vários aspectos que vou enunciar: Como te defines como pessoa?
TH. Sou humilde…ou pelo menos tento ser. Tento preocupar-me com os outros e não me centrar muito em mim.
: Como estudante?
TH. Persistente. Posso bater muitas vezes com a cabeça na parede mas vou lá de novo até partir a parede.
: Como atleta em treino?
TH. Maluca! É a única forma de aguentar estes treinos [risos e olha para o treinador que acompanha a entrevista].
Mas muito competitiva. Gosto muito de competição nos treinos e agora tenho os rapazes mais novos [do Sporting de Braga] que estão a subir o nível, e eu gosto de competir com eles e gosto de sair do treino e saber que dei o máximo.
: Como atleta em competição?
TH. Um pouco medricas. Não é bem uma característica, mas por vezes sinto algum receio antes de uma prova. Mas também sou muito focada.
Muitas vezes fico nervosa, mas o facto de me ter focado na prova e de a ter visualizado mentalmente, faz-me encontrar o ponto de equilíbrio e isso é importante em provas longas onde também é precisa a persistência e a maluquice, porque para nadar 1500 é preciso ter um parafuso a menos [risos].
: Gostas mais de nadar ou de ganhar?
TH. De ganhar, claro!
: Quem é o teu nadador ou nadadora de referência?
TH. Neste momento acho que é a Mireia [Belmonte]. Treina imenso…eu sou capaz de me queixar dos meus treinos mas sei que ela treina 20 vezes pior.
É uma referência e não só como atleta. Conheço-a pessoalmente e ela é uma pessoa muito simples e muito simpática.
Não tem características físicas especiais que a façam ser a super campeã que é, apenas o trabalho. É uma inspiração para mim e respeito-a muito pelo trabalho dela.
: Achas que há Fair Play na natação?
TH. Há! Mesmo que tenhamos adversários de quem não gostamos, lembramo-nos que todos passamos pelo mesmo, que todos sofremos nos treinos e que todos nos privamos de muitas coisas para estar na natação.
As melhores amigas que tenho, fi-las na natação e quando vejo outras nadadoras a fazerem mínimos para competições internacionais, fico muito feliz por elas, porque não lhes tenho só amizade, também lhes tenho muito respeito!
Muito obrigado, Tamila e votos de muito sucesso para o futuro!