Não há derbies com pouca importância. Ainda que o próximo, a disputar no próximo sábado, não fosse decisivo para a atribuição do titulo, haveria um sem fim de dados a compilar e adicionar à já longa história que se vai escrevendo desde 1 de dezembro de 1907. E há sempre muito a perder e a ganhar, até mesmo para o Sporting, que já está longe do título.
Foi então, em Carcavelos, onde jogava o Sport Lisboa, que o encontro aconteceu. O facto do Sporting se ter apresentado com oito ex-jogadores do adversário seria um dos muitos pontos de ignição da combustão permanente de rivalidade em que os embates entre os dois emblemas se confundem com a história do futebol português.
Para o Sporting pouco ou nada se poderá alterar de verdadeiramente significativo no que diz respeito à história deste campeonato. O terceiro lugar é cada vez mais a linha limite que se desenha no horizonte. Mesmo a tão útil como necessária qualificação directa para Liga dos Campeões, por via do segundo lugar, parece de todo improvável, atendendo a que já não há confronto directo com o FC Porto. A possibilidade da equipa de Nuno Espírito Santo perder o conforto dos cinco pontos que ainda detém em cinco jornadas é possível mas pouco provável.
Assim, o próximo derby será acima de tudo para o Sporting um jogo pelo brio e pelo orgulho e defesa do seu próprio palmarés. Isto porque não me parece provável que haja danos ou proveitos reais que se possam estabelecer na próxima temporada a partir do resultado final deste jogo. Mas, emoção, orgulho e brio são precisamente os principais temperos destes embates. E aqui há pelo menos um castelo a defender nesta história já secular de conquistas e desaires: impedir a entrada do rival no clube exclusivo dos tetracampeões. Um lugar que durante várias décadas foi apenas do Sporting e que agora tem de compartilhar com o FC Porto.
Historicamente, o papel de demolidor de “sonhos do tetra a vermelho” tem até agora sido bem sucedido. Apesar do rival ser o clube mais titulado do nosso campeonato, o titulo de tetracampeão continua por alcançar. Até hoje o SL Benfica dispôs de cinco hipóteses de conquistar um lugar cativo nesse clube tão exclusivo e nunca o concretizou.
Na primeira oportunidade, depois de conquistar os títulos das épocas de 35/36, 36/37, 37/38, o clube da Luz nem sequer discutiu o título. Quedou-se abaixo do campeão FC Porto, e do Sporting, que daria luta até final, ficando apenas com menos um ponto.
A primeira grande disputa ombro a ombro havia de acontecer na época 65/66. O Sporting era então o único tetracampeão, por força dos campeonatos de 1950 a 1954, pelo que luta foi feroz. Ao vencer em Alvalade a sete jornadas do fim, o SLB ficou à distância de um ponto, mas os nervos de aço dos pupilos de Otto Glória e Juca acabaram por manter a tetra-exclusividade até final.
O Sporting pareceu então especializar-se na defesa dos seus pergaminhos, pois foi novamente a barreira que se ergueu aos sonhos mais rubros dos rivais em 73/74. Na até agora derradeira possibilidade, foi o FC Porto que se entrepôs aos desejos benfiquistas, quando em 77/78 ganhou finalmente o campeonato, após 19 anos de jejum.
Desenha-se agora uma nova oportunidade para o seu eterno rival. Se um derby por si só já encerra todos os ingredientes necessários para a motivação dos jogadores, o que se disputará no relvado será um novo e suculento pedaço na história de uma rivalidade secular.
Há história que se escreve em cada decisão acertada e em cada erro ou falha. Defender a porta de entrada do seu clube exclusivo de tetracampeões é a derradeira tarefa de Jesus e dos seus comandados para o que resta da época. E nestas questões de história e de palmarés jogam-se valores que rivalizam com a conquista de títulos.